Quando a religião está a serviço do capitalismo Davi Amancio de Souza-Vitória da Conquista-fevereiro de 2025
Por Davi Amancio
Publicada em 1904, a obra, a ética protestante e o “espírito” do capitalismo, se constitui em um tratado sobre religião e sociedade, e apresenta reflexões sobre como o capitalismo encontrou na religião um terreno fértil para florescer no contexto europeu. Para isso se valendo de elementos da fé cristã, o espirito do capitalismo se proliferava, mas com uma fé agora não mais nos moldes daquele Jesus, que sobre ele mesmo afirmou, “que não tinha onde reclinar a cabeça”. Essa, porém era uma fé capitalista com disposição para receber e não para entregar.
Afinal, um modo de vida tão simples assim não combinava com a opulência da nova ordem social que tinha como pano de fundo o capital, como a soma de todos os valores da sociedade. Assim, o cristianismo vigente nos dias de Weber no século XX, e praticado dentro da perspectiva puritana, não comportava a pobreza nem tão pouco o ócio, e assim serviria para justificar o capitalismo.
Quanto a pobreza, esta não poderia ser bem vinda, uma vez que, “o bem estar financeiro era sinônimo da graça divina” para o movimento puritano. Quanto ao trabalho, este não era visto como na perspectiva bíblica, trabalhar para ter pra você e para dar ao seu companheiro, conforme afirmou Paulo, mas sim como um meio para se chegar a um fim. Nesse sentido, as escrituras são usadas pelos ascetas, (puros, ou irrepreensíveis), nessa nova ordem religiosa a “puritana”, para apoiar uma nova concepção de sociedade.
Se voltarmos um pouco na história é possível encontrar no contexto brasileiro a bíblia sendo usada de forma irresponsável, e com uma hermenêutica precária, mas bem conveniente para legitimar interesses de líderes déspotas ou capitalistas, seja no contexto religioso ou na política, das formas mais variadas na sociedade, visto que com ela se prova o que se quer.
Na introdução, da obra, a ética protestante e o espirito do capitalismo, o autor faz uma abordagem sobre as diversas transformações ocorridas no mundo do trabalho e como o ocidente se destaca pelo fato de inventar uma nova forma de capitalismo que tem como característica principal, “o lucro”: O capitalismo, porém identifica se com a busca do lucro, do lucro sempre renovado por meio da empresa permanente, capitalista e
racional”. Vê-se, portanto, que se trata de um lucro continuo, e que ocorra de forma racional, ou mesmo irracional.
Ou seja, nas novas configurações do trabalho, o explorado sabe o que está fazendo, de forma consciente e de boa vontade se deixa explorar por meio do trabalho, conforme esse autor destaca. “Modernamente, porém, o Ocidente desenvolveu, além desse, uma forma muito diferente de capitalismo, que nunca havia aparecido antes: a organização capitalista racional do trabalho livre, pelo menos formalmente”.
Ao falar sobre filiação religiosa e estratificação social, o autor lembra que as bases econômicas de uma pessoa naquele período estavam vinculadas diretamente ao tipo de filiação religiosa, nesse sentido, é possível dizer que havia uma religião formada de pessoas com padrões econômicos elevados conforme o autor destaca:
“É bem verdade que a maior participação relativa dos Protestantes na propriedade do capital, na direção e nas esferas mais altas das modernas empresas comerciais e industriais pode em parte ser explicada pelas circunstâncias históricas oriundas de um passado distante, nas quais a filiação religiosa não poderia ser apontada como causa de condição econômica, mas até certo ponto parece ser resultado daquela”
Partindo dessa perspectiva, o trabalho para produzir riqueza no espectro do puritanismo, como algo que glorificava a DEUS. Naquele tempo as forças religiosas que se expressavam por esses canais eram igualmente influências decisivas na formação do caráter nacional.
Entretanto o autor destaca dois aspectos distintos entre o asceta do monastério, na perspectiva luterana, e o asceta puritano na esfera calvinista: Para o primeiro: A riqueza em si constitui grande perigo; suas tentações não têm fim, e sua busca não é o asceta do puritanismo também por sua vocação para o trabalho: apenas sem sentido, se comparada com a importância superior do Reino de Deus, mas também moralmente suspeita. Já para o segundo, esta vocação não é, como para os luteranos, – um destino ao qual deva se submeter e sair se o melhor possível, mas um mandamento de Deus ao indivíduo para que trabalhe para a glória divina.
Embora, a obra apresenta um relato sucinto de outros ramos do protestantismo da época, como Quaker, (amigos), que era composto de vários grupos religiosos, com origem comum num movimento protestante britânico do século XVII. Além dos Menonitas com
esse nome derivado de Menno Simons, pastor holandês, precursor dos Batistas, dos Menonitas e dos irmãos Menonitas.
Os menonitas, formavam assim um movimento do cristianismo evangélico que descendia diretamente do movimento anabatista que surgiu na Europa no século XVI, na mesma época da Reforma Protestante, formado originalmente por pessoas que dedicavam sua vida a Deus através do protestantismo, movimento que veio depois da Reforma Protestante.
Mas as lentes de Weber, enquanto sociologo, estão direcionadas no capitulo 05 desta obra para compreender a relação entre, o ascetismo e o espírito do capitalismo. E, utilizando a teoria da ação social, e fato social ou fato puro, como categorias do método compreensivo, o autor faz uma análise sobre o ascetismo e o espirito do capitalismo. Nesse sentido, a tipologia da ação social seria fundamental para a compreensão do tipo da ação que estava em questão.
Uma racionalidade a uma atividade aparentemente irracional – a de acumular riqueza além do necessário. Esse elemento irracional o autor classifica como a “vocação” que habita o capitalismo. Entretanto surge uma questão, proposta pelo autor;
Dessa forma, o capitalismo contava agora com um elemento que poderia ser mais valioso que a crítica da economia política na perspectiva marxista movida pela indignação quanto a expropriação dos trabalhadores da indústria, o capital agora poderia se utilizar da fé como um ingrediente valioso no sentido de retroalimentar o capital. Mas essa mesma ética que despertava interesse entre o povo, fazia surgir críticas de outros teólogos, como Wesley que afirmou:
“Temo que, sempre que aumentam os ricos, a essência da religião decresça na mesma proporção. Por isso, dada a natureza das coisas, não vejo como seja possível, que se mantenha o ressurgimento da verdadeira religião. Pois a religião deve necessariamente produzir tanto a operosidade c na frugalidade, e isso não pode produzir senão riqueza. Mas aumentando os ricos, aumenta também o orgulho, a cólera e o mor ao inundo e todos seus aspectos”.
A respeito desse fenômeno Paul Lafargue conclui: O capital é o Deus que todos conhecem, veem, tocam, cheiram, saboreiam; ele existe para todos os nossos sentidos, Ele é o único Deus que ainda não encontrou um ateu.
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